quarta-feira, 24 de junho de 2009

Um dia de fúria (Dia 12 - 25.maio)

Saí de casa meio tarde. Meu plano do dia era ir à Montjuic.

Eu não sabia exatamente o que encontrar ali. Sabia pelo guia que era um morro, meio parque, com atrações turísticas e não-turísticas, com parque de diversões, Fundação Miró (uma das coisas pretendidas, mas que por ser segunda, estava fechado), umas construções da época das Olimpíadas de 92, o estádio do esqueci-o-time, uma fonte luminosa como a do Ibirapuera etc. Combinei de ir com o Gabriel, o amigo argentino que fiz no dia anterior.

Era a minha primeira experiência em 12 dias de viagem em que compartilharia com alguém as decisões de para onde-como-porque ir, visitar alguma coisa ou não, andar pelas ruas ou pegar ônibus, parar para comer ou tomar café, decidir se para esquerda ou direita. Por isso mesmo, podia ser bom e podia ser ruim.

Foi bom. Porque não tínhamos grandes expectativas, havia o mesmo sentimento de ir ver o que aquilo era e não havia cobrança, horários e compromisso, o que pode arruinar uma viagem. E ademais, eu estava muito cansada de falar inglês-espanhol-português-de-portugal e Gabriel ouvia pacientemente minhas palavras em bom brasileiro, que eu misturava com o espanhol.

Desse dia não tenho fotos, porque, por algum motivo, a câmera que deixei carregando durante a noite e mostrou a luzinha verde, ficou sem bateria. Gabriel ainda me deve as fotos dele.

Pegamos um ônibus até uma praça, acho que ali era a Plaza d'Espanya, onde parei numa lan house para ver a situação de troca de datas do hotel de Paris e da volta para São Paulo. Isso me afligia.

(Nessa altura, eu, que esperei tanto pra chegar a Barcelona, não via a hora de ir embora de lá. Coisas que acontecem em viagem. E aprendi ali que não é necessário gostar de tudo. Realmente, tive um problema com a cidade. Lisboa tinha sido perfeita, e eu queria seguir em frente, tinha mais 2 dias de apê do Jair e depois ia ter que ficar me virando naquela cidade que me parecia uma invasão de alemães, que era em muitos momentos um metrô lotado a céu aberto, isso por mais 5 dias, que me pareciam mais tortura que férias).

Gabriel tinha um notebook, mas precisávamos achar um lugar com "uifí" (como eles falam "uaifái"). Então, seguimos, independente disso, a caminhar e achar a escadinha que nos levaria a uma parte do cume do Montjuic.

Demos de cara com o tal do Poble Espanyol. Ô, coisa pra turista. Ruim. Eu não paguei por causa da carteirinha, mas depois, andando por lá, falamos sobre a roubada de 15 euros em que estávamos. Na verdade, eu não falava "roubada", eu falava "enganação", ou algo assim. Em português mesmo. E ele entendia, óbvio, porque os 15 euros dele é que doíam, enganados.

Esse treco é como se fosse uma vilinha, cada construção remete a uma região/país/cidade espanhola, e têm a construção "como se fosse" da data da plaquinha afixada na porta do estabelecimento, que vende "artesanatos", ou seja, imãs de geladeira etc. Difícil explicar, mas seguramente, não vale.

Pra não dizer que é horrivelmente nada a ver, a vista é maravilhosa. E tem um museu dentro, onde vimos umas esculturas do Dalí, umas gravuras do Miró, umas "cerâmicas" do Picasso (ele brincava de massinha às vezes) e umas contemporaneidades estranhas, mas divertidas quando olhadas em dupla. Isso porque eu tinha as minhas reflexões e pensamentos sempre só pra mim e meu caderninho, e pela primeira vez, podia dizer "joder! qué mierda eso, no?" ou "aaahhhh, mira eso!!". E falar sobre. Discutir. Rir. Etc.

Fora que me aproveitei do fato de ele ser hispano-hablante pra "pede pra mim?". E ele sempre começava ou terminava os pedidos com um "mi amigo" tão carinhoso que me sentia feliz em ser latinoamericana e não europeia.

Andamos prum lugar com uma construção cheia de nomes de presidentes europeus e uma fonte ENORME. Não era uma fonte, era uma cascata gigante, sei lá; um gramado lindo, um dia lindo. Depois, o tal estádio, o "bonde" pra descer a "serra", e chegar de volta à maluquice da Rambla.

Combinamos de ver um filme mais tarde, ele iria pro hotel e depois falaríamos. Fui pra "casa", e qual supresa: a fechadura (que já tinha problema mesmo, mas eu já sabia a manha) tinha sido trocada!!! Só que não havia um aviso nem nada sobre. E eu, com medo de quebrar a chave da casa alheia, comecei a tocar pelo interfone em números aleatórios para que alguém atendesse e eu explicasse a situação (je-sus, em espanhol da argentina, meio brasileiro...). Eram 23h.

Fernanda: "Hola, ¿qué tal? Desculpame, estoy en el primero isquierda, pero la llave no se puede, no sé qué pasa..."

Um homem começa a gritar pelo interfone: "*(@#()&@$&())p#@khdjkhsa&(*¨@#&*%$*@#$¨*("

Fernanda: "Cómo????"

Um homem continua a gritar pelo interfone:"*(@#()&@$&())p#@khdjkhsa&(*¨@#&*%$*@#$¨*("

Fernanda pensa: "Ai, caraças, que que eu vou fazer agora?????"

Eis que surge o anjo loiro que eu nunca soube o nome (Jair sabe), ela mora no predinho e tem um bar/restaurante embaixo e me viu na situação.

anja loira: "Hola, yo tengo la llave, es que cambiaran hoy, y no pusieron un afiche para que la gente que no estaba pudiera saber, dale, dale, que yo abro para ti"

Fernanda: "Ay, qué buenísimo, te agradezco mucho, ay, qué bueno, qué pasó, cambiaran y...?"

anja loira: "Si, si, estava como podrido, y cambiaron, no sé quién fué a darles las llaves a todos pero, claro, no pensó en lo que no estaban"

Fernanda: "claro, yo sali temprano... bueno, y ahora, qué hago?"

anja loira: "Dale, tienes que hablar con Pepito, del Atrio segundo"

Fernanda: "Pero, ahora? A las 23h?"

anja loira: "Si, no hay nada"

Fernanda: "gracias tanto, muchas gracias, fuiste maravillosa"

anja loira: "Voy a poner un afiche ahí, tienes razón"

etc.

O homem que gritava pelo interfone:"*(@#()&@$&())p#@khdjkhsa&(*¨@#&*%$*@#$¨*("
continuou, mas dessa vez eu encontrei com ele na escada. Era do meu tamanho, peludão, de regata, PUTO com a minha presença, parecia puto E catalão, porque apesar de eu falar e entender espanhol, aquele cara devia falar catalão, porque eu não entendia nada.

E não havia conversa mesmo: eu falava, ele respondia (na verdade, ele não parava de falar, desgovernada indignação), e a gente ia subindo os 5 lances de escada em busca de Pepito, o cara da chave.

Bati na porta do Pepito, o outro praguejando na minha orelha por 5 andares e um pouco de térreo: o Pepito abre a porta vestidinho com aquele pijama clássico branco com listrinhas azuis, camisa e calça. Super bonzinho e calmo e velhinho e me deu a chave e foi um doce, o Pepito. Me desculpei muito pela hora e ele só me devolveu em sorriso velhinho e listrado.

Nessa hora, eu achei que já estava com a razão, e comecei a descer, e então o baixinho peludo e mala ia parar. Que nada. Continuou, e eu " deve ser catalão aquilo, mas eu entendo catalão, não, não é possível, deve ser mouro, deve ser grego, deve ser bárbaro, de ser visigodo".

Seguimos descendo até o andar dele (segundo, terceiro?), e eu desci mais, até entrar em casa, e entrar direto no banho, pra tentar esquecer aquilo.

Impossível. Tomei banho, comi, falei com o Gabriel por SMS, mas na minha cabeça estava o #()&@$&())p#@khdjkhsa&(*¨@#&*%$.

Liguei pro Gabriel levar água mineral (essa coisa de água da torneira é coisa de europeu, eles bebem assim, mas o gosto é horrível, e eu quero é a mineral) e tal. Levou. E vimos Os Simpsons, O Filme. É ótimo ver como as nossas vozes são melhores, apesar de parecidas.

Mas na verdade eu vi só até a hora do "porco aranha". Dormi profundamente logo depois disso.

Um comentário:

Jeferson Cardoso disse...

Fernanda, viajar é prazeroso, mas também cansa.
Jefhcardoso do
http://jefhcardoso.blogspot.com